GLOBALIZAÇÃO E ÁREAS CULTURAIS. A ÁREA CULTURAL LUSO-BRASILEIRA.
Moisés de Lemos Martins (Universidade do Minho – Braga/Portugal)

Ao autonomizar-se como variável dominante no mundo, a globalização fraccionou as sociedades transcontinentais, cujos projectos todavia a precederam: o Brasil e os Estados Hispânicos convergem no Mercosul; por sua vez, a francofonia, a Comunidade Britânica, a lusofonia e o panarabismo desenvolveram linhas diferenciadas na unidade do continente africano; além disso, o Corão apela à identidade de um cordão muçulmano que, de Gibraltar à Indonésia, divide o norte do sul do mundo.
Nestas circunstâncias, é certamente desafiante a tarefa de harmonizar tão diferenciadas e múltiplas filiações, umas baseadas na experiência e na história, outras induzidas pelas leituras do futuro premente. Hoje, todas as áreas culturais falam pela primeira vez com voz própria na cena internacional e vêem-se forçadas à convergência pela globalização derivada das revoluções científica, técnica e dos mercados. Neste contexto, cada país vai ter que considerar a ligação a grandes espaços diferenciados e, conjunturalmente, vai ter que considerar também a ligação a espaços com interesses que podem ser contraditórios.
Ao reflectir sobre a lusofonia, há que assinalar a multidão de pessoas que tem a língua portuguesa como primeira língua. São 210 milhões os falantes de português, quase tantos como os falantes de francês (120 milhões) e de alemão (100 milhões) juntos. Depois do chinês, com 850 milhões de falantes, do hindi com 400 milhões, do espanhol com 390 milhões, do inglês com 354 milhões e do árabe com 272 milhões, o português vem a seguir, em sexto lugar. No entanto, na era da informação global, impressiona saber que os utentes da Internet de língua inglesa são 30% do total, os de língua chinesa 13,3% e os de língua 8%, à frente dos utentes de Internet de língua espanhola, que são 7,5% do total e dos utentes de Internet de língua portuguesa, que não passam de 3,1%.
Quando falamos de informação, pela imprensa escrita, pela rádio e pela televisão, e também pela Internet, não podemos deixar de ter em atenção que a informação se faz em línguas, que é sempre precisa uma língua natural para a divulgarmos. À medida, todavia, que o mundo se torna mais global, que a velocidade dos transportes encolhe as distâncias geográficas, que as redes de telecomunicações se espalham em maior largura de banda, a pressão por uma só língua aumenta. No entanto, todos aqueles que se acham comprometidos com a língua portuguesa têm que estar nessa luta. Preservar uma língua, expoente máximo de uma cultura, é saber fortificá-la na comunicação diária e global. Neste sentido, é dever dos falantes de uma língua cultivá-la e promovê-la, porque é na língua em que sentimos, pensamos, nos exprimimos e comunicamos, que se joga a identidade de uma povo, de uma cultura, de uma civilização. Mais que quaisquer outros falantes, são instrumentos activos dessa fortificação linguística os profissionais da comunicação social, e também os professores de língua e cultura portuguesa. É um facto que o intercâmbio editorial entre Portugal e o Brasil, e também o intercâmbio entre os países africanos de expressão oficial portuguesa, continua a ser incipiente. Mas é expectável que língua funcione aqui como um importante instrumento comercial, cultural e político, num tempo marcado pela globalização, interculturalismo e multiculturalismo. O que em nada contradiz, todavia, a consideração de realidades nacionais multiculturais em distintas regiões do globo, com a língua portuguesa a ter que se relacionar com outras línguas locais e a ter que entrar em muitos casos em competição com elas.